Há 50 anos que se sabe que a vida deste macaco pelado que somos, queimando, para seu conforto em sentido lato, lenha, carvão e, por fim, petróleo (lenha muito, muito antiga) aumenta o CO2 na atmosfera para lá do que as plantas precisam. A luz do Sol aquece a Terra, que irradia calor, raios infravermelhos, uma frequência muito baixa para passar a camada de CO2 nas alturas, aquecendo o nosso planeta— CO2 que vai aumentando; desce um pouco no Verão, porque a terra firme, com plantas verdes, está sobretudo no hemisfério Norte mas logo sobe, no Inverno seguinte, para um valor superior ao do Inverno anterior. Hoje sabemos, pelo CO2 nas rochas, que nos últimos 650 000 anos, pelo menos, nunca esse valor foi tão alto.
Sabemos mas não queremos saber.
O relatório da Nações Unidas, elaborado por 2500 cientistas, que vai sair no princípio de 2007 virá mostrar a verdade ou, pudicamente, cobri-la, de novo, que não é coisa que se mostre? É fácil mentir a quem quer ser enganado— nós todos!
A desinformação utiliza cientistas famosos por ter mostrado a verdade, rendidos, entretanto à necessidade de não criar pânico—e de comprar uma casa de ferias.
O filme de Al Gore, “Uma Verdade Inconveniente” foi claríssimo, pelo menos para quem cultivar o espírito científico— mas pouca gente o viu. E, além disso, as grandes decisões politicas, como aceitar o protocolo de Quioto, são cada vez menos influenciadas pela opinião pública e, até, pelos políticos—as grandes decisões são tomadas pelo anónimo mundo financeiro, são as que dão mais lucro.
Talvez as imagens mais chocantes desse filme fossem as fotografias de satélite de uma região da Antártida, ao longo dos anos: na primeira uma enorme superfície branca, depois com uns pontos negros, por fim, uns riscos irregulares. Os pontos negros eram pequenos lagos, vistos de perto. A água, em vez de os reflectir, como o gelo, absorve os raios solares, aquece. Brevemente a região mais exposta da Antártida era uma enorme massa de gelo esburacado como um queijo suíço pelo crescimento desses lagos; chegada a água a terra firme fez uma camada lubrificante e a gravidade fez o resto. O gelo partiu em fatias que vão deslizando para o mar e criando lindos icebergs; uma península onde o fenómeno se vai passar a seguir, uns 10% do Continente da Antártida, corresponde a tanto gelo como o que resta na Groenlândia e será suficiente, derretidos os icebergs, para subir o nível do mar 6 metros, seis, por extenso! A velocidade do fenómeno é imprevisível, mas poucos anos temos para agir.
O ecossistema que a Terra é funciona por limiares, como os seres vivos. Imaginemo-nos no deserto, a aquecer. A homeostasia mantém o nosso corpo a 37 graus centígrados, para isso utiliza o gasto de energia que há na passagem da água de líquida a gasosa. Mas gasta água! Se um helicóptero nos levar a um serviço de Urgência onde nos arrefeçam e reponham a água, com um soro, podemos recuperar o equilíbrio que é a vida. Mas há um limiar a partir do qual o equilíbrio se rompe para sempre. As alterações, muito rápidas depois desse limiar atingido, são irreversíveis.
A administração americana, o governo Bush, pediu à NASA para criar uma comissão científica para estudar quanto tempo temos. O chefe dessa comissão ficou escandalizado quando o relatório que iam apresentar foi “corrigido” pelo burocrata que a presidia, um advogado. Aceitou falar à BBC e mostrou o relatório com as correcções: foi censurado onde se fala no tempo máximo de dez anos que poderemos ter para parar a subida de CO2, sem fenómenos irreversíveis. Sacrificou o emprego, é um herói do século XXI, o advogado, demorou, mas foi forçado pelos jornais a demitir-se: trabalha actualmente na Exxon.
Há casos, nos serviços de Urgência, de doentes que estão a ir para o bloco operatório e a família (ou o doente!) pede para ir a outro médico, a uma clínica, para ter uma outra opinião. Manda quem pode! O paciente perde um tempo precioso em exames etc.(há quem ganhe com isso) e o cuidado pode ser fatal. Também há médicos que, muito preocupados para não assustar o doente, lhe dizem que não é grave, claro que tem tempo a perder!
Há quem ache que a verdade pode ser prejudicial. Vamos a ver o que sai do oficialíssimo relatório das Nações Unidas, o resultado da diplomacia sobre o que se pode dizer ao doente.
Porque creio que o pânico é, muitas vezes, um mal menor face ao adiamento.
http://www.theclimateproject.org/
Um glaciar que, dantes (foto pequena), tinha gelo!
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