Respeito, dignidade, estes são valores centrais da Organização das Nações Unidas, são valores que estão na base da criação da Paz. Embora haja jovens que querem a independência, o Dalai Lama pede apenas contactos para uma autonomia; o importante é que se pare de tentar destruir uma cultura, com a sua religião, aquela que está no “Tecto do Mundo”, por sinal.
Petição pelo fim da violência no Tibete
De uma fotografia de Mica Costa Grande, Laasa, Novembro de 2003
Outra petição, ao Presidente da China, que vai em quase 800 milhões (errata de 14.Maio.2008: onde se lê "milhões" leia-se "mil". Hoje, o dobro, um milhão e seicentos mil).
Deixo aqui uma homenagem aos portugueses que tiveram a coragem de nos libertar de uma ditadura anacrónica, de nos restituir a liberdade e a dignidade.
Ao contrário dos outros ditadores europeus dos anos 30, Salazar era instruído, professor catedrático da Universidade de Coimbra, mentia, intimidava e matava para se conservar no poder -- mas com muita competência, dentro da "legalidade".
"(...)e por outras maneiras que sabemos
Tão sábias, tão subtis e tão peritas
Que não podem sequer ser bem descritas"
como tão bem o descreveu a Sophia, nesse tempo. Escrevia bem, um português escorreito, nada que se pareça com o "Mein Kampf", era mesmo competente, como tirano! Outro escrito de Sophia :
O velho abutre alisa as suas penas
A podridão lhe agrada e os seus discursos
Têm o dom de fazer as almas mais pequenas
Aqui ficam alguns dos grandes feitos do "maior português de sempre", uma lista injustamente pouco conhecida, por um lado porque a modéstia do Doutor, no seu tempo, não permitiu à imprensa que a divulgasse e, por outro lado, porque, quando ela a pôde publicar, nós, mal agradecidos, já não queríamos saber:
1931
O estudante V. Branco morto pela PSP, durante uma manifestação no
Porto;
1932
Armando Ramos, jovem, morto em consequência de espancamentos; Aurélio
Dias, fragateiro, é morto após 30 dias de tortura; Alfredo Ruas, é
assassinado a tiro durante uma manifestação em Lisboa;
1934, 18 de Janeiro
Américo Gomes,operário, morre em Peniche, após dois meses de tortura;
Manuel Vieira Tomé, sindicalista ferroviário morre durante a tortura
em consequência da repressão da greve;Júlio Pinto,operário vidreiro,
morto à pancada; a PSP mata um operário conserveiro durante arepressão
de uma greve em Setúbal
1935
Ferreira de Abreu, dirigente da organização juvenil do PCP, morre no
hospital após ter sido espancado na sede da PIDE (PVDE);
1936
Francisco Cruz, operário da Marinha Grande, morre na Fortaleza de
Angra do Heroísmo, vítima de maus-tratos, é deportado do 18 de Janeiro
de 1934; Manuel Pestana Garcez, trabalhador, é morto durante a
tortura;
1937
Ernesto Faustino,operário;José Lopes, operário anarquista, morre
durante a tortura, sendo um dos presos da onda de repressão que se
seguiu ao atentado a Salazar; Manuel Salgueiro Valente,
tenente-coronel, morre em condições suspeitas no forte de Caxias;
Augusto Costa, operário da Marinha Grande, Rafael Tobias Pinto da
Silva, de Lisboa, Francisco Domingues Quintas, de Gaia, Francisco
Manuel Pereira, marinheiro de Lisboa, Pedro Matos Filipe, de Almada e
Cândido Alves Barja, marinheiro, de Castro Verde, morrem no espaço de
quatro dias no Tarrafal, vítimas das febres e dos maus tratos;
Augusto Almeida Martins, operário, é assassinado na sede da PIDE
(PVDE) durante a tortura; Abílio Augusto Belchior,operário do Porto,
morre no Tarrafal,vítima das febres e dos maus-tratos;
1938
António Mano Fernandes, estudante de Coimbra, morre no Forte de
Peniche, por lhe ter sido recusada assistência médica, sofria de
doença cardíaca; Rui Ricardo da Silva, operário do Arsenal, morre no
Aljube, devido a tuberculose contraída em consequência de
espancamento perpetrado por seis agentes da PIDE durante oito horas;
Arnaldo Simões Januário, dirigente anarco-sindicalista, morre no campo
do Tarrafal, vítima de maus-tratos; Francisco Esteves, operário
torneiro de Lisboa, morre na tortura na sede da PIDE; Alfredo
Caldeira, pintor, dirigente do PCP, morre no Tarrafal após lenta
agonia sem assistência médica;
1939
Fernando Alcobia, morre no Tarrafal,vítima de doença e de maus-tratos;
1940
Jaime Fonseca de Sousa, morre no Tarrafal,vítima de maus-tratos;
Albino Coelho, morre também no Tarrafal;Mário Castelhano, dirigente
anarco-sindicalista, morre sem assistência médica no Tarrafal;
1941
Jacinto Faria Vilaça, Casimiro Ferreira; Albino de Carvalho;António
Guedes Oliveira e Silva; ErnestoJosé Ribeiro,operário, e José Lopes
Dinis morrem no Tarrafal;
1942
Henrique Domingues Fernandes morre no Tarrafal; Carlos Ferreira
Soares, médico, é assassinado no seu consultório com rajadas de
metralhadora, os agentes assassinos alegam legítima defesa (?!); Bento
António Gonçalves,secretário-geral do P. C. P. Morre no
Tarrafal;Damásio Martins Pereira, fragateiro, morre no Tarrafal;
FernandoÓscar Gaspar, morre tuberculoso no regresso da
deportação;António de Jesus Branco morre no Tarrafal;
1943
Rosa Morgado, camponesa do Ameal (Águeda), e os seus filhos, António,
Júlio e Constantina, mortos a tiro pela GNR; Paulo José Dias, morre
tuberculoso no Tarrafal; Joaquim Montes, morre no Tarrafal com febre
biliosa; José Manuel Alves dos Reis morre no Tarrafal; Américo
Lourenço Nunes,operário, morre em consequência de espancamento
perpetrado durante a repressão da greve de Agosto na região de Lisboa;
Francisco do Nascimento Gomes, do Porto, morre no Tarrafal; Francisco
dos Reis Gomes, operário da Carris do Porto, é morto durante a
tortura;
1944
General José Garcia Godinho morre no Forte da Trafaria, por lhe ser
recusado internamento hospitalar; Francisco Ferreira Marques, de
Lisboa, militante do PCP, em consequência de espancamento e após um
mês e meio de incomunicabilidade; Edmundo Gonçalves, morre tuberculoso
no Tarrafal; uma mulher e uma criança, assassinados a tiro de
metralhadora durante a repressão da GNR sobre os camponeses rendeiros
da herdade da Goucha (Benavente), mais 40 camponeses feridos a tiro.
1945
Manuel Augusto da Costa morre no Tarrafal; Germano Vidigal, operário,
assassinado com esmagamento dos testículos, depois de três dias de
tortura no posto da GNR de Montemor-o-Novo; Alfredo Dinis (Alex),
operário e dirigente do PCP, é assassinado a tiro na estrada de
Bucelas; José António Companheiro, operário, de Borba, morre de
tuberculose em consequência dos maus-tratos na prisão;
1946
Manuel Simões Júnior, operário corticeiro, morre de tuberculose após
doze anos de prisão e de deportação; Joaquim Correia, operário
litografo do Porto, é morto por espancamento após quinze meses de
prisão;
1947
José Patuleia, assalariado rural de Vila Viçosa, morre durante a
tortura na sede da PIDE;
1948
António Lopes de Almeida, operário da Marinha Grande, é morto durante
a tortura; Artur de Oliveira morre no Tarrafal; Joaquim Barreiros,
marinheiro da Armada, morre no Tarrafal após doze anos de
deportação;António Guerra, operário da Marinha Grande, preso desde 18
de Janeiro de 1934, morre quase cego e após doença prolongada;
1950
Militão Bessa Ribeiro, operário e dirigente do PCP, morre na
Penitenciaria de Lisboa, durante uma greve de fome e após nove meses
de incomunicabilidade; José Moreira, operário, assassinado na tortura
na sede da PIDE, dois dias após a prisão, o corpo largado por uma
janela do quarto andar para simular suicídio; Venceslau Ferreira morre
em Lisboa após tortura; Alfredo Dias Lima, assalariado rural, é
assassinado a tiro pela GNR durante uma manifestação em Alpiarça;
1951
Gervásio da Costa, operário de Fafe, morre vítima de maus-tratos na
prisão;
1954
Catarina Eufémia, assalariada rural, assassinada a tiro em Baleizão,
durante uma greve, com uma filha nos braços;
1957
Joaquim Lemos Oliveira, barbeiro de Fafe, morre na sede da PIDE no
Porto após quinze dias de tortura; Manuel da Silva Júnior, de Viana
do Castelo, morto durante a tortura na sede da PIDE, no Porto, sendo o
corpo, irreconhecível, enterrado ás escondidas num cemitério do Porto;
José Centeio, assalariado rural de Alpiarça,e assassinado pela PIDE;
1958
José Adelino dos Santos, assalariado rural, assassinado a tiro, pela
GNR, durante uma manifestação em Montemor-o-Novo; vários outros
trabalhadores feridos a tiro; Raul Alves, operário da Póvoa de Santa
Iria, após quinze dias de tortura, largado por uma janela do quarto
andar da sede da PIDE; a esposa do embaixador do Brasil assiste à sua
morte;
1961
Cândido Martins Capilé,operário corticeiro, é assassinado a tiro pela
GNR durante uma manifestação em Almada; José Dias Coelho, escultor e
militante do PCP,é assassinado à queima-roupa numa rua de Lisboa;
1962
António Graciano Adágio e Francisco Madeira, mineiros em Aljustrel,
assassinados a tiro pela GNR; Estêvão Giro,operário de Alcochete, é
assassinado a tiro pela PSP durante a manifestação do 1: de Maio em
Lisboa;
1963
Agostinho Fineza, operário tipógrafo do Funchal, é assassinado pela
PSP, sob a indicação da PIDE, durante uma manifestação em Lisboa;
1964
Francisco Brito, desertor da guerra colonial, é assassinado em Loulé
pela GNR; David Almeida Reis, trabalhador, assassinado por agentes da
PIDE durante uma manifestação em Lisboa;
1965
General Humberto Delgado e a sua secretaria Arajaryr Campos
assassinados a tiro em Vila Nueva del Fresno (Espanha) pelo inspector
da PIDE Rosa Casaco, o sub-inspector Agostinho Tienza e o agente
Casimiro Monteiro;
1967
Manuel Agostinho Góis, trabalhador agrícola de Cuba, morre vítima de
tortura na PIDE;
1968
Luís António Firmino, trabalhador de Montemor, morre em Caxias, vítima
de maus-tratos; Herculano Augusto, trabalhador rural, espancado e
morto no posto da PSP de Lamego por condenar publicamente a guerra
colonial; Daniel Teixeira, estudante, morre no Forte de Caxias, em
situação de incomunicabilidade, depois de agonizar durante uma noite
sem assistência;
1969
Eduardo Mondlane, dirigente da Frelimo, assassinado através de um
atentado organizado pela PIDE;
1972
José António Leitão Ribeiro Santos, estudante de Direito em Lisboa e
militante do MRPP, assassinado a tiro durante uma reunião de apoio à
luta do povo vietnamita e contra a repressão; o seu assassino, o
agente da PIDE Coelho da Rocha, viria a escapar-se na
"fuga-libertação" de Alcoentre, em Junho de 1975;
1973
Amílcar Cabral, dirigente da luta de libertação da Guiné e Cabo Verde,
é assassinado por um bando mercenário a soldo da PIDE, chefiado por
Alpoim Galvão;
1974, 25 de Abril
Fernando Carvalho Gesteira, de Montalegre,José Barreto, de Vendas
Novas, Fernando Barreiros dos Reis, soldado de Lisboa e José Guilherme
Rego Arruda, estudante dos Açores, assassinados a tiro pelos pides
acoitados na sua sede na Rua António Maria Cardoso, ainda feridas duas
dezenas de pessoas.
Houve ainda dezenas de mortos na repressão da revolta da Madeira, em Abril de 1931 e dezenas na repressão da revolta de 26 de Agosto de 1931. Um número indeterminado de mortos nas deportação para a Guiné, Timor, Angra e Cunene. Um número indeterminado de mortos devido à
intervenção da força fascista dos "Viriatos" na guerra civil de
Espanha e a entrega de fugitivos aos pelotões de fuzilamento
franquista; as dezenas de mortos em São Tomé, na repressão ordenada
pelo governador Carlos Gorgulho sobre os trabalhadores que recusaram o
trabalho forçado, em Fevereiro de 1953. Muitos milhares de mortos
durante as guerras coloniais, vítimas do Exército, da PIDE, da OPVDC,
dos "Flechas", etc.
Chegou o Verão e Piotr viu, na cozinha, o jornal que Alfred deixara, com uma fotografia de Hitler em Paris. Piotr escreveu no jornal, em polaco, com o lápis da cozinha: “quem não respeita a dignidade dos outros não respeita a sua”. Aconteceu-lhe! Sabia que era um gesto absurdo, demasiado perigoso, inútil, mas não foi procurar uma borracha para apagar o que escrevera. Deixou-o, assim, em cima da mesa da cozinha.
E, quando Alfred, que só falava com ele para lhe dar ordens, lhe pediu que traduzisse, Piotr, que sabia alemão para isso, disse: “quem não respeita a dignidade dos outros não respeita a sua”.
Alfred tinha 50 anos, era lavrador; tinha o filho na guerra e o filho fazia-lhe falta. Abstraindo da parte sentimental, era-lhe difícil arranjar um substituto para o trabalho que o filho fazia, um que aceitasse trabalhar só pela comida e fosse bem mandado, como era o filho, antes da guerra. Mas Alfred era patriota, ouvia o Fuehrer na rádio e trazia o cartão de membro do partido na carteira. Não reclamava. Falara, porém, no partido, da falta de mão-de-obra e tinham-lhe mandado Piotr.
Piotr tinha 20 anos, era filho de um lavrador e tinha sido apanhado na aldeia e transportado para ali. Chegara esfomeado e aterrorizado mas, quando lhe tinham dado uma malga de sopa, sorrira; tinha um sorriso bonito. Alfred, porém, não sorrira; lembrara-se das recomendações do partido para ter todo o cuidado em manter a dignidade da raça superior nas relações com o eslavo (houvera quem sentasse um escravo à mesa e isso fora muito criticado); assim, Alfred, que dantes comia na cozinha com a mulher, transformara o quarto do filho em sala de jantar e arranjara um lugar para Piotr no estábulo, que lhe pareceu mais quente que o celeiro.
Alfred não disse nada. Como interpretar aquilo? O rapaz compreendia que respeitava a sua dignidade respeitando a do seu senhor? Mas que dignidade poderia ter um eslavo? A palavra "dignidade" existia em polaco? Alfred afeiçoara-se ao rapaz, ele sabia da poda, havia uma cumplicidade silenciosa entre lavradores (Piotr gostava de trabalhar, o trabalho distraía-o das toneladas de memórias e preocupações pelos seus que carregava às costas; era saudável e davam-lhe de comer, não estava na guerra, como o pobre do filho do Alfred, cuja sorte era bem pior)...
E se ele não compreendesse que era de uma raça inferior? Na verdade até a Alfred lhe custava compreender, compreendia que os judeus eram uma raça inferior, desprezível, como os homossexuais ou os ciganos, mas aquele rapaz loiro e de olhos azuis… bem, os cientistas alemães tinham decretado que os eslavos eram uma raça de escravos, quem era ele para duvidar disso?
Deitou fora o jornal, não fora alguém lembrar-se de castigar o rapaz, que lhe fazia falta, e reforçou a sua pose de senhor: virava as costas quando o eslavo lhe dirigia a palavra, tornou-se ainda mais distante, senhoril: estava em jogo a dignidade da raça ariana! “Só os fortes sobrevivem!”, nada de mostrar respeito pelos inferiores, tolerância, no máximo.
Piotr esqueceu-se do caso, trabalhava, comia, dormia e tinha esperança que os polacos americanos convencessem o Roosevelt a entrar na guerra.
Mas Alfred decidira educar o rapaz: explicava-lhe a sorte que a Polónia tinha em ser governada por alemães, uma raça superior física e intelectualmente, os senhores naturais do mundo e sugeria que, se ele compreendesse bem isso e tivesse qualidades de lutador, um dia, como ele tinha amigos no partido, Piotr poderia fazer um exame de raça e talvez passasse por ariano. Piotr enfurecia-se calado, na sua pose de eslavo respeitador, não queria problemas, trabalho sem comida.
Mas tantas vezes vai o cântaro à fonte até que parte: Alfred atribuía os problemas do mundo aos judeus quando Piotr disse: “tenho bons amigos judeus, na minha terra, nunca nos trataram com a falta de respeito com que os alemães nos tratam”. “Mas tu és alemão”, disse Alfred. “Sou polaco, graças a Deus”, disse Piotr.
“Mas nós respeitamos os povos inferiores que colaborarem connosco”.
”Não há povos inferiores, se houvesse seriam os que não respeitam os outros”.
“Respeitamos quem merece respeito”.
“Só se pode conversar com respeito mútuo”, disse Piotr.
“Mas eu até converso contigo, que és um eslavo!”
“Não conversa”, disse Piotr, “para conversar é preciso admitir a hipótese de que, da conversa, se saia a pensar de uma forma mais esclarecida— e o Alfred admite que um eslavo o esclareça? — apenas admite que eu possa ser esclarecido, embora de uma raça de fracos, desprovidos de pensamento abstracto, não é uma conversa!”.
Alfred deu meia volta, virou-lhe as costas, penitenciando-se da sua fraqueza, da vergonha de não ter sabido intimidar aquele eslavo com a força natural da sua raça: aquele rapaz era tão inferior intelectualmente que nem sabia reconhecer um superior quando o via!
Meia dúzia de anos depois Alfred ouvia na rádio a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada nas Nações Unidas. Piotr ouvia-a na sua aldeia. Pode ser que não tivesse sido preciso bombardear Dresden para vencer a guerra— mas tinha sido preciso vencê-la! Ambos, ouvindo a palavra “dignidade”, lembraram-se do jornal escrito a lápis e pensaram que a Dignidade bem podia ser uma matriz para construir a Europa da Paz.
Se procurarmos o que nos une, europeus, para que Norte aponta a bússola da nossa civilização, o que procuramos criar com a Democracia, o Desenvolvimento e a Descolonização, que eram os três DD do 25 de Abril, o dia do nosso regresso a casa, cabeça perdida da Europa que éramos, encontraremos um valor, para nós, europeus, fundamental e que não sabemos imaginar que o não seja no Mundo: a Dignidade humana.
É um conceito que implica o respeito pela liberdade, pela democracia, que implica que se acabe com a fome, a miséria, a iliteracia, a falta de abrigo, que implica que as minorias sejam respeitadas e se possam exprimir—é um vasto conceito. A nossa civilização admira quem, em circunstâncias adversas, mantém a sua dignidade, mesmo sacrificando a vida; mas caminha para uma sociedade em que essas circunstâncias não existam, em que as agressões à dignidade humana sejam impensáveis.
Convém lembrar que apenas 33 anos nos separam dessas circunstâncias politicas, no nosso país.
E lembrar que ainda temos muito pela frente, que o medo teve 40 ou 50 anos para se entranhar nas pessoas que ainda não acreditam que voltámos à Europa.
Ainda há quem sinta que não conseguirá resolver nada numa repartição pública se lá não conhecer alguém, ainda se pede a quem conheça o médico da pessoa de família que foi internada que “dê uma palavrinha” por ela (diga-se que não foram os médicos quem criou essa atitude!); ainda se receia não conseguir um trabalho por razões exteriores à competência profissional …
O liberalismo económico, dinheiro gera dinheiro, está a criar uma separação entre os que o têm e os que o não têm que faz lembrar tempos antigos.
Foi a fome de dignidade, não apenas de comida, que levou tantos portugueses, nos anos 60, para as terras frias do Norte da Europa, votando com os pés, envergonhando Salazar. Lembro-me do espanto dos que aceitavam o salazarismo quando se falava de dignidade humana— nunca tinham tido a sua pisada, não achavam que isso fosse um assunto político: “afinal, mesmo na prisão, um homem pode manter a sua dignidade, é um assunto pessoal! E, se são capazes, trabalhadores, inteligentes, porque não se juntam a nós, que vivemos bem? O regime é justo!”.
A Europa é uma árvore jovem, com 50 anos, que ainda se alimenta do estrume do nazismo e da sua guerra. Não deixemos de a regar: há períodos de seca pela frente, há doenças possíveis, riscos vários, tempestades— acarinhemo-la!
É possível que o filme que precede o logótipo das comemorações dos 50 anos da Europa
se inspirasse nesta imagem de Europa, satélite de Júpiter, tirada pela sonda Galileu.
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